Um estudo recente publicado no Journal of Affective Disorders trouxe à tona uma forte conexão entre o neuroticismo e a probabilidade de morte precoce por diferentes causas. O neuroticismo, um traço de personalidade caracterizado pela instabilidade emocional e pela tendência a experimentar emoções negativas, como ansiedade, medo e solidão, há muito tempo está associado a problemas de saúde mental e física. No entanto, este novo estudo oferece uma visão mais detalhada ao explorar como diferentes componentes deste traço, em especial a solidão, influenciam o risco de mortalidade.
O estudo analisou dados de quase meio milhão de participantes do UK Biobank. A partir desses dados, revelou-se que indivíduos com níveis mais altos de neuroticismo tinham um risco 10% maior de morrer por qualquer causa durante o período de acompanhamento de 13,4 anos. Além disso, entre os componentes deste traço, a solidão se destacou como o fator mais significativo. Pois pessoas que relataram se sentir solitárias apresentaram um risco 46% maior de morte em comparação com aquelas que não se sentiam solitárias.
Explorando a Relação entre Neuroticismo e Mortalidade
Pesquisas anteriores sobre o neuroticismo apresentaram conclusões divergentes, com algumas sugerindo que não havia uma ligação clara entre o neuroticismo e a mortalidade. No entanto, outras indicavam que pessoas com escores elevados de neuroticismo poderiam enfrentar um risco maior de morte prematura. Este novo estudo buscou oferecer uma compreensão mais detalhada ao examinar causas específicas de morte. Para isso, os pesquisadores exploraram doenças como câncer, doenças cardiovasculares, doenças respiratórias e causas externas, incluindo acidentes e autolesão. O objetivo era esclarecer se certos componentes do neuroticismo, como a solidão, tinham uma relação mais forte com a morte precoce em comparação com outros.
Solidão: O Mais Forte Preditor de Morte Precoce
Entre os componentes do neuroticismo, a solidão emergiu como o preditor mais forte de morte prematura. Pois indivíduos que relataram sentimentos de solidão apresentaram um risco significativamente maior de morte, especialmente entre homens mais jovens e pessoas sem ensino superior. Além disso, esse vínculo foi observado de forma independente de outros aspectos do neuroticismo. Portanto, sugerindo que a solidão, por si só, constitui um fator de risco substancial para a mortalidade precoce.
Outros estudos associaram oscilações de humor e sentimentos de frustração, aspectos do neuroticismo, a riscos elevados de morte, especialmente por doenças respiratórias e digestivas. Curiosamente, componentes como ser uma pessoa preocupada ou sentir culpa não se mostraram fortemente ligados à morte precoce. Pois indivíduos que relataram se preocupar excessivamente após situações embaraçosas apresentaram um risco ligeiramente menor de morte. Os pesquisadores especulam que isso reflete um comportamento mais cauteloso ou vigilante.
Análise Técnica: Métodos Utilizados na Pesquisa
Para medir o neuroticismo, os pesquisadores aplicaram um questionário de 12 itens da Eysenck Personality Questionnaire, amplamente usado em estudos de personalidade. Então, os participantes responderam a afirmações como “Você costuma se preocupar?” e “Você frequentemente se sente solitário?” com base em quanto essas afirmações descreviam seu comportamento típico. Um escore de neuroticismo foi calculado para cada participante, e os pesquisadores analisaram os componentes individuais deste traço, como solidão, oscilações de humor e irritabilidade.
Os pesquisadores usaram modelos estatísticos para ajustar variáveis como idade, sexo, nível educacional, hábitos de tabagismo e condições de saúde subjacentes, como diabetes e hipertensão. Dessa forma, essa abordagem garantiu que os pesquisadores não atribuíssem as associações observadas entre neuroticismo e mortalidade a outros fatores de risco para a saúde.
Limitações do Estudo e Necessidade de Mais Pesquisas Sobre Neuroticismo
Embora o estudo seja robusto, é importante considerar algumas limitações. Os pesquisadores extraíram os dados do UK Biobank, que não representa totalmente a população geral. Pois os participantes tendem a ser mais saudáveis e mais escolarizados do que a média, o que pode limitar a generalização dos resultados para outros contextos.
Outra limitação é que o estudo não considerou mudanças no neuroticismo ao longo do tempo. É possível que eventos de vida significativos, como doenças graves ou a morte de um ente querido, possam aumentar os níveis de neuroticismo, influenciando o risco de morte precoce. Pesquisas futuras poderiam explorar como as mudanças nos traços de personalidade ao longo da vida afetam os resultados de saúde.
Os pesquisadores também destacaram a necessidade de mais investigações sobre os mecanismos específicos pelos quais o neuroticismo influencia a mortalidade. Embora suas análises tenham considerado fatores como tabagismo e condições de saúde subjacentes, os mecanismos exatos que ligam o neuroticismo à morte precoce permanecem incertos.