Philip Crilly, Kingston University
A toxina botulínica, mais conhecida como Botox, é famosa por sua capacidade de suavizar rugas. Mas esconder as linhas de expressão do mundo não foi o motivo pelo qual os primeiros cientistas começaram a experimentar essa substância.
A toxina botulínica é produzida pela bactéria Clostridium botulinum. Em sua forma mais bruta, pode causar a doença fatal botulismo. Porém, na forma usada nas indústrias cosmética e médica, é tão diluída e processada que não apresenta esse risco.
O Botox foi usado pela primeira vez na medicina nos anos 1970 por um oftalmologista americano chamado Alan Scott para ajudar pacientes com uma condição chamada estrabismo (mais conhecida como desvio ocular). O médico notou que, ao ser injetado ao redor do olho, o Botox não apenas ajudava a tratar o estrabismo, mas também reduzia rugas e linhas de expressão.
Dado o fascínio público por parecer mais jovem, houve um enorme interesse por essa descoberta. No entanto, ela só foi aprovada para uso cosmético pelos reguladores de medicamentos em 2002 nos EUA e, desde então, em muitos outros países.
É assim que ele é mais comumente usado hoje – foram administradas quase 9 milhões de injeções para reduzir rugas globalmente em 2023. Contudo, ele ainda é amplamente utilizado para uma variedade de propósitos médicos. Aqui estão alguns surpreendentes:
1. Distúrbios Oculares
Pessoas com distúrbios oculares podem se beneficiar de injeções de Botox. Os distúrbios oculares mais comuns tratados dessa forma são estrabismo e blefaroespasmo (espasmos nas pálpebras).
Quando alguém tem desvio ocular, os músculos que controlam o movimento dos olhos estão fora de sincronia – o que faz com que cada olho olhe em direções diferentes. As injeções de Botox ajudam a relaxar esses músculos, corrigindo o desalinhamento.
Pessoas com blefaroespasmo, por outro lado, sofrem contrações involuntárias dos músculos ao redor dos olhos – levando a espasmos nas pálpebras ou aumento do piscar. As injeções de Botox administradas ao redor do olho relaxam os músculos envolvidos no piscar, reduzindo os espasmos e o desconforto.
Os efeitos positivos do Botox no tratamento do blefaroespasmo parecem durar entre 12 e 14 semanas. Para o estrabismo, os benefícios podem durar até seis meses.
2. Suor Excessivo
Embora suar seja uma função corporal essencial que regula a temperatura, em excesso pode ser embaraçoso e desconfortável. Essa condição, conhecida como hiperidrose, pode ser causada por diversos fatores – incluindo diabetes, distúrbios da tireoide ou menopausa.
Antitranspirantes regulares têm pouco efeito na redução desse excesso de suor, então alguns pacientes recorrem às injeções de Botox. Estas funcionam entorpecendo os nervos que estimulam a sudorese, reduzindo assim a quantidade de suor produzido. Usuários precisam de injeções regulares a cada quatro meses a um ano para manter os benefícios.
3. Enxaqueca
Alguns pacientes com enxaqueca experimentam sintomas tão debilitantes que são incapazes de realizar suas atividades diárias. Injeções de Botox podem ajudar a prevenir enxaquecas em pessoas que sofrem regularmente (pelo menos oito por mês) e para quem outros tratamentos não funcionaram. O Botox bloqueia os sinais de dor do cérebro, reduzindo ou prevenindo os ataques.
Pacientes que utilizaram Botox para esse fim relataram uma redução pela metade do número de enxaquecas e menos dor durante os ataques. As injeções geralmente são necessárias a cada 12 semanas.
4. Bexiga Hiperativa
Uma bexiga hiperativa cria a necessidade de urinar com muito mais frequência que o normal. Isso pode ser extremamente constrangedor e afetar negativamente a qualidade de vida. Embora exercícios para o assoalho pélvico e certos medicamentos possam ajudar, eles nem sempre funcionam para todos.
As injeções de Botox são uma alternativa. Uma das causas da bexiga hiperativa é a contração excessiva dos músculos da bexiga. O Botox relaxa esses músculos, reduzindo a frequência do desejo de urinar. Esses efeitos podem durar entre seis meses a um ano – após os quais são necessárias novas injeções.
5. Síndrome da Ausência de Arrotos
Embora não ser capaz de arrotar não pareça um problema óbvio, pode ser angustiante para quem o vivencia. O arroto é a forma do corpo eliminar gases digestivos. Não conseguir eliminá-los pode levar a inchaço e desconforto.
Pessoas incapazes de arrotar têm uma condição rara conhecida como disfunção cricofaríngea retrograda, ou “síndrome da ausência de arrotos”. Nesse caso, os músculos do pescoço que permitem liberar gases digestivos são incapazes de relaxar, impedindo o corpo de liberar essas bolhas de ar. Isso pode causar aumento de flatulência, inchaço, náusea e até soluços dolorosos.
O Botox está sendo usado para ajudar pessoas com essa condição. Injeções no pescoço relaxam os músculos que impedem o arroto. Isso permite que os gases passem sem obstruções.
6. Depressão
O Botox pode até ser usado para tratar depressão de longa duração em pessoas que não responderam a outros tratamentos.
Numerosos estudos indicaram que pacientes com depressão que receberam injeções de Botox notaram uma melhora no humor. Embora a razão para isso não seja totalmente clara, alguns cientistas acreditam que esteja relacionada à forma como nossos músculos faciais e expressões influenciam nossas emoções. Como o Botox anestesia esses músculos, acredita-se que isso envia sinais específicos ao cérebro que melhoram o humor.
Portanto, o Botox provou ser mais do que uma simples solução para rugas. Não apenas ajuda pessoas com várias condições médicas a viver vidas mais normais, como também está sendo investigado para tratar uma variedade de outros problemas médicos. Entre eles estão a dor, a coceira crônica e até o manejo dos efeitos colaterais de tratamentos de câncer.
Philip Crilly, Professor Associado em Prática Farmacêutica e Saúde Pública Digital, Kingston University
Este artigo foi republicado de The Conversation sob uma licença Creative Commons. Leia o artigo original.