A exposição a microplásticos na gravidez representa um risco invisível, com partículas de micro e nanoplásticos (MNPs) menores que 5 mm e 1000 nm, se infiltrando no ar, alimentos e água. Elas são subprodutos do desgaste de plásticos maiores, resultantes de processos mecânicos e degradação pela luz ultravioleta. Embora pareçam inofensivas, essas partículas são capazes de atravessar barreiras biológicas e se acumular em órgãos vitais, como pulmões, coração e fígado. A detecção de MNPs em tecidos relacionados à saúde materno-fetal, como a placenta e o leite materno, sugere que os riscos dessas partículas vão além da mera contaminação ambiental. Pois as evidências apontam que estão afetando o desenvolvimento pré-natal e o início da vida.
Investigando a Exposição a Microplásticos na Gravidez e o Impacto nos Filhotes
Um estudo recente publicado no periódico Science of The Total Environment avaliou se os MNPs podem permanecer nos tecidos de filhotes de ratos após a exposição materna durante a gestação. Para isso, ratas grávidas foram expostas a aerossóis de poliamida-12 (PA-12), um microplástico identificado em tecidos humanos, durante dez dias do período gestacional. A escolha do PA-12 se deu pela sua representatividade ambiental e pela capacidade de atravessar barreiras biológicas. Os pesquisadores analisaram os órgãos dos filhotes, incluindo pulmão, fígado, rim, coração e cérebro, para verificar a bioacumulação de MNPs após o nascimento.
O método de exposição envolveu uma câmara personalizada para aerossolização, simulando condições reais de exposição a MNPs em ambientes ocupacionais. As análises por microscopia hiperespectral revelaram que as partículas de PA-12 estavam presentes em todos os órgãos examinados dos filhotes expostos. Dessa forma, indicando que a exposição materna resulta em uma transferência significativa dessas partículas para os filhotes. No entanto, não foram observadas mudanças patológicas evidentes entre os grupos expostos e os de controle. Porém, a presença de MNPs em múltiplos órgãos levanta preocupações sobre os efeitos cumulativos e subclínicos dessas partículas no desenvolvimento.
Persistência e Bioacumulação: Implicações para a Saúde a Longo Prazo
A descoberta de MNPs nos tecidos de filhotes, mesmo duas semanas após o nascimento, confirma que a exposição materna resulta em uma persistência dessas partículas além do período gestacional. Assim, esse achado é especialmente relevante para a teoria das Origens Desenvolvimentistas da Saúde e da Doença (DOHaD). Pois esta teoria sugere que exposições ambientais durante a gestação podem predispor a prole a doenças crônicas na vida adulta. Dessa forma, aumentando as chances de desenvolver obesidade, doenças cardiovasculares e distúrbios metabólicos. A ligação entre MNPs e processos inflamatórios e endócrinos sugere que a exposição precoce a essas partículas pode ter consequências duradouras na saúde.
Em estudos com células humanas, o PA-12 mostrou-se capaz de causar danos genéticos, inflamação e distúrbios hormonais. Assim, sugerindo que os efeitos dos MNPs vão além do acúmulo físico e podem impactar processos biológicos fundamentais. Nos filhotes analisados, o acúmulo de MNPs em órgãos vitais, como o cérebro e os pulmões, sugere a possibilidade de interações prejudiciais com o desenvolvimento celular e o sistema imunológico. Os efeitos negativos podem não se manifestar imediatamente, mas sim ao longo do tempo.
Limitações e Necessidade de Estudos Futuros
Apesar das descobertas relevantes, o estudo apresenta algumas limitações. A amostra reduzida não permitiu identificar diferenças significativas entre sexos ou entre os grupos de controle e expostos. Pesquisas futuras devem incluir amostras maiores e técnicas avançadas para quantificação precisa dos MNPs nos tecidos, além de avaliar os efeitos em fases posteriores da vida. Isso permitirá uma melhor compreensão dos mecanismos pelos quais os MNPs influenciam a saúde e se a bioacumulação observada pode ser um fator desencadeante de doenças.
Os achados enfatizam a necessidade de considerar os MNPs não apenas como contaminantes ambientais, mas como potenciais agentes que impactam a saúde materno-infantil. A persistência dessas partículas em organismos em desenvolvimento representa um desafio para a ciência, exigindo mais investigações sobre os riscos associados à exposição e estratégias de mitigação para reduzir os impactos durante a gestação e a infância.