O Que Acontece Quando Você Aceita Que Pode Estar Errado?
Num mundo cada vez mais inflamado por certezas absolutas e bolhas digitais, um estudo ousado conduzido em Israel lança luz sobre uma virtude quase subversiva nos dias de hoje: a humildade intelectual.
Pesquisadores como Michal Lehmann (Carnegie Mellon University), Anat Perry, Shir Genzer, Nur Kassem(Hebrew University) e Daryl R. Van Tongeren (Hope College) investigaram uma pergunta potente: Será que admitir que você pode estar errado aumenta sua capacidade de entender emocionalmente o outro?
A resposta, distribuída em três estudos rigorosos com 533 participantes judeus israelenses, é clara: sim. E não apenas isso. Pessoas com maior humildade intelectual mostraram mais precisão ao identificar emoções em membros do “outro grupo” — no caso, mulheres palestinas israelenses — do que ao julgar membros de seu próprio grupo. Isso é revolucionário. Você se conecta melhor com quem está mais distante de você — quando você aceita que não sabe tudo.
Esse estudo, publicado no Personality and Social Psychology Bulletin, desafia diretamente a lógica tribal da sociedade moderna. O insight é chocante: quanto mais certo você se sente, menos você compreende os outros. E quanto mais você aceita a própria falibilidade, mais empático e resiliente você se torna.
E o pior? A maioria das pessoas nem sabe que isso está acontecendo.
A Ciência da Empatia: Frieza Cognitiva ou Calor Emocional?
A pesquisa foi meticulosa: os participantes assistiram a vídeos com histórias emocionais reais, narradas tanto por judias quanto por palestinas israelenses. Enquanto viam os vídeos, avaliavam as emoções das falantes em tempo real, usando uma escala deslizante.
Além disso, os pesquisadores mediram três variáveis distintas:
- Precisão empática cognitiva (quanto você acerta na emoção do outro),
- Preocupação empática (compaixão, solidariedade),
- Angústia pessoal (quando a dor do outro vira um fardo para você).
O resultado? A humildade intelectual aumentou a empatia cognitiva e a preocupação empática, sem aumentar a angústia pessoal. Essa combinação rara e poderosa recebeu um nome: resiliência empática.
Imagine isso aplicado a líderes, professores, casais, políticos. Pessoas que se conectam emocionalmente com os outros sem serem drenadas por isso. Pessoas que entendem sem precisar concordar. Isso é ouro em tempos de guerra ideológica.
Você Não Precisa Nascer com Humildade Intelectual, Mas Pode Ser Treinado.
O terceiro estudo da série foi ainda mais audacioso: os pesquisadores testaram se era possível aumentar artificialmente a humildade intelectual.
Os participantes foram divididos em dois grupos: um leu conteúdos que incentivavam a dúvida saudável, o outro leu textos que reforçavam certezas absolutas. O grupo “humilde” saiu com níveis significativamente maiores de empatia — mesmo que o efeito tenha sido indireto.
Isso abre portas para algo transformador: intervenções educacionais e sociais para treinar empatia a partir da humildade. Escolas, empresas, grupos de diversidade e inclusão, casamentos — todos podem se beneficiar disso.
Mas há um detalhe incômodo. O estudo foi feito apenas com judeus israelenses avaliando palestinos. Ainda não sabemos se a reciprocidade é verdadeira — e os próprios autores alertam que mais dados são necessários. Será que palestinos também desenvolvem empatia por judeus ao aumentarem sua humildade intelectual? E nos EUA? Entre negros e brancos? Gays e héteros? Neurotípicos e neurodivergentes?
Essas são perguntas urgentes. Porque enquanto você lê isso, conflitos reais continuam sendo alimentados por certezas absolutas e intolerância emocional.
O Que Está Em Jogo Quando Você Não Escuta
A mensagem final do estudo é clara, mas incômoda: não saber ouvir pode custar muito caro — em empatia, em relações e em paz social.
Você pode continuar defendendo sua opinião como se fosse uma bandeira. Pode continuar apenas ouvindo quem concorda com você. Mas a ciência está dizendo: esse caminho diminui sua capacidade de compreender os outros. Você se isola. Você se engana. E no fim, você perde.
Agora, imagine o oposto: aceitar que você pode estar errado. Que você tem limites. Que sua visão é parcial. E, justamente por isso, você se torna mais empático, mais resiliente, mais humano.
Isso não é fraqueza. Isso é evolução.